Os seus primeiros passos no mundo criativo deram-se nos finais dos anos 90, na altura como grafiteiro. Posteriormente, enquanto frequentava uma formação em Informática na Óptica do Utilizador, teve contacto pela primeira vez com o software de design gráfico CorelDraw. O percurso de Lito Ngunza, um dos criativos angolano mais talentoso dos últimos anos é notório e é pautado pelos sólidos e variados projectos que foi desenvolvendo, seja como profissional autónomo, em agências ou do lado do cliente.
Nos últimos 3 anos tem se dedicado à criação de design de embalagem e visualização de produtos, sendo o responsável pelo desenvolvimento de marcas nacionais como Eka Chill, Booster Manga Laranja, Booster Morango, Booster Cider, e pelos rebranding da Nocal e Drena Energy Drink. Pela sua mesa passaram também os trabalhos de adaptação das marcas internacionais Pepsi, Mirinda e 7Up (pertencentes ao Grupo PepsiCo), desde a concepção e desenvolvimento de rótulos, campanhas publicitárias, filmes e animações 3D.
Autodidata, criativo, artista, entusiasta do Motion Design Graphic, amante de VFX, animação 3D e CGI, Lito Ngunza trabalha há mais de 15 anos na indústria publicitária angolana, e actualmente actua como Director Criativo no Grupo Castel Angola. Em 2023 Lito Ngunza foi reconhecido no maior Festival Nacional de Publicidade de Angola, o FestiPub, tendo arrecadado 6 Prémios nas categorias de Visualização de Produto, Designer de Embalagem, Poster e Cartaz.
Começou pelo cliente ou por uma agência? Como foi esse período de crescimento e aprendizado?
A minha jornada no mundo da publicidade começou em um pequeno atelier que actualmente poderia ser considerado uma agência de publicidade, a World Designer que ficava localizado na Mutamba.
Comecei como cortador de papel, utilizando uma guilhotina manual e, às vezes, um X-ato em uma mesa de vidro com régua de metal para cortar cartolinas e papéis. Após seis meses nesse ambiente, surgiu a minha primeira oportunidade como designer júnior.
Durante esse período de crescimento e aprendizado, a humildade e a resiliência foram ingredientes essenciais. Estar imerso no processo de aprendizagem constante, lidar com desafios e buscar soluções criativas foram aspectos fundamentais nesse período que contribuíram significativamente para o meu desenvolvimento como designer.
Tem no seu percurso passagens por algumas grandes agências do nosso mercado. De que forma é que cada uma delas contribuiu para o profissional que é hoje o Lito Ngunza?
Cada passagem por agências renomadas como TBWA, Executive, BORN e Zwela representou uma fase crucial na minha jornada profissional, moldando significativamente a minha trajectória como designer e criativo.
Na TBWA, considero ter recebido o meu “ensino médio” em publicidade, onde aprendi a arte de definir conceitos criativos, criar briefings eficazes e realizar apresentações impactantes.
A fase da Bee Executive se assemelha mais a minha “universidade”. Lá, mergulhei na ciência por trás do trabalho em equipa, compreendi como um projecto criativo é desenvolvido, desde a colaboração entre a dupla criativa até a participação do Director Criativo, Director de Arte e do Redactor Publicitário.
A passagem pela BORN foi como um “mestrado” para mim. Aprendi a gerir o orçamento do cliente, negociar com fornecedores, coordenar produções, seleccionar modelos e dirigir sessões fotográficas, entre outros aspectos cruciais do trabalho na área.
Cada uma dessas agências contribuiu de forma única para o meu crescimento profissional, e hoje considero-me um profissional completo graças às valiosas experiências e aprendizados adquiridos ao longo desse percurso.
O que mais lhe ajudou a se tornar no profissional que é hoje? As experiências práticas ou as formações ao longo do tempo?
De certeza que foi a combinação entre a minha busca incessante por aprendizado e a oportunidade de trabalhar ao lado de profissionais excepcionais, como Artur Carvalho, Odair Peres, Claudio Rafael, João Nunes, João Geada, João Filipe e Rui Pombo, que foram verdadeiros mestres para mim.
Acredito que foi a fusão entre as experiências práticas e as formações ao longo do tempo que moldaram a minha trajectória profissional. Por um lado, as experiências práticas me permitiram aplicar e aprimorar as minhas habilidades em situações reais, enfrentando desafios em busca de soluções criativas. Por outro lado, as formações ao longo do tempo, tanto formais quanto autodidatas, me proporcionaram uma base sólida de conhecimento e técnica que me permitiram expandir os horizontes e explorar novas áreas dentro do design e da publicidade.
Trabalhou como freelancer por um período. Quais foram as maiores diferenças que enfrentou e como essa experiência moldou a sua abordagem criativa?
A experiência como freelancer trouxe uma série de diferenças significativas em comparação ao trabalho em agências tradicionais. Uma das principais diferenças foi a liberdade criativa que tive ao trabalhar de forma independente. Como freelancer, pude explorar uma variedade de disciplinas no design, aproveitando ao máximo a minha expertise em diferentes áreas.
Em contraste, nas agências tradicionais, muitas vezes me deparei com um processo estruturado de criação, onde as ideias criativas passavam por várias etapas e aprovações. Desde o briefing inicial até a apresentação final do layout criativo, por exempol. Havia uma hierarquia e um conjunto de regras a serem seguidos. Essa liberdade criativa como freelancer me permitiu experimentar mais, explorar novas abordagens e técnicas, e desenvolver o meu próprio estilo distintivo. Sem as restrições de um ambiente corporativo, pude responder de forma mais ágil e flexível às necessidades dos clientes, adaptando-me rapidamente às mudanças e demandas do mercado.
É uma experiência que moldou a minha abordagem criativa de maneiras significativas. Aprendi a confiar mais na minha intuição e a abraçar a espontaneidade e a improvisação como parte do processo criativo. Além disso, adquiri habilidades de gestão de tempo e organização, aspectos essenciais para equilibrar múltiplos projectos e prazos apertados.
Digo que a experiência como freelancer me tornou mais versátil, adaptável e confiante na minha capacidade de enfrentar desafios criativos de forma inovadora e eficaz.
Em conjunto com a sua equipa, fez o lançamento da Pepsi e a consequente adaptação de outras marcas do Grupo PepsiCo no mercado angolano. Quer nos falar desta experiência?
Participar do lançamento da Pepsi e da adaptação de outras marcas do Grupo PepsiCo no mercado angolano foi uma experiência incrível e desafiadora. Trabalhar em conjunto com a equipa criativa da PepsiCo dos Estados Unidos da América, proporcionou um intercâmbio valioso de ideias e conhecimentos.
A nossa equipa teve a oportunidade de propor à PepsiCo dos EUA um novo visual para a marca, que incluía a introdução de uma nova garrafa de tamanho padrão Rgb de 250ml e 270ml (estilo champanhe), alinhada com as especificações do Grupo Castel. Foi uma experiência gratificante ver a nossa proposta ser aceite e implementada com sucesso.
Ao longo desse processo, enfrentamos uma série de desafios, desde a adaptação da identidade visual das marcas ao mercado local até a garantia de que os padrões de qualidade e as expectativas dos consumidores fossem atendidas. No entanto, o trabalho em equipa, a criatividade e a dedicação de todos os envolvidos foram fundamentais para superar esses obstáculos e alcançar resultados excepcionais.
Ver o lançamento da Pepsi e a adaptação das marcas Mirinda e 7Up no mercado angolano foi uma experiência que demonstrou o poder da colaboração e da inovação na construção de marcas de sucesso. Estou orgulhoso do trabalho que realizamos e ansioso para futuras oportunidades de contribuir para o crescimento e sucesso das marcas no mercado angolano.
Do ponto de vista técnico, quais são os desafios de se adaptar localmente a comunicação de uma marca internacional?
Do ponto de vista técnico, adaptar localmente a comunicação de uma marca internacional envolve desafios como compreender a cultura local, seguir regulamentações locais, ajustar os canais de distribuição e mídia, analisar a concorrência local e adaptar-se à tecnologia e infraestruturas locais.
Como lida com a pressão de manter a originalidade e relevância em campanhas para marcas destas dimensões?
É, sem dúvida, um desafio constante. No entanto, acredito que quando se ama o que se faz, o trabalho se transforma em algo mais do que apenas uma obrigação – torna-se uma paixão.
Para mim, a pressão de manter a originalidade e relevância em campanhas para marcas de grande dimensão é algo que, quase imperceptivelmente, se funde com o prazer de criar. Quando estou imerso num projecto, a adrenalina e o entusiasmo de encontrar soluções criativas superam qualquer pressão que possa existir. Além disso, acredito firmemente na importância de se manter actualizado com as tendências do mercado, estudar o comportamento do consumidor e buscar constantemente inspiração em diversas fontes. Isso me ajuda a permanecer relevante e a garantir que as minhas campanhas estejam alinhadas com as expectativas do público-alvo.
Encaro a pressão como um estímulo para superar desafios e elevar constantemente o padrão de qualidade do meu trabalho. A paixão pelo que faço e o compromisso com a excelência me ajudam a enfrentar qualquer pressão que surja no processo criativo.
Fazer adaptações das comunicações ou trabalhar elas do zero? O que prefere? Porquê?
A minha preferência é definitivamente trabalhar nas comunicações do zero. Quando começamos um projecto a partir do zero, temos a oportunidade de dar asas à nossa criatividade e imaginação. Podemos explorar novas ideias, conceitos e abordagens que sejam autênticas e genuinamente originais.
Além disso, começar do zero nos permite entender completamente o produto ou a marca com a qual estamos a trabalhar. Podemos mergulhar fundo na sua essência, compreender os seus valores, objectivos e identidade única. Isso nos ajuda a criar uma comunicação que seja verdadeiramente autêntica e relevante para o público-alvo.
Adaptar comunicações existentes pode ser necessário em algumas situações, mas a criação do zero oferece uma liberdade criativa incomparável. É uma oportunidade de dar vida a algo novo e emocionante, e é por isso que prefiro começar do zero sempre que possível.
Sendo um líder criativo, como inspira e motiva a sua equipa a alcançar novos patamares de excelência criativa?
Como líder criativo, é essencial inspirar e motivar a minha equipa para alcançarmos novos níveis de excelência. Sigo alguns princípios-chave:
– Estabeleço um ambiente aberto para compartilhar ideias e preocupações, promovendo colaboração;
– Confiar na equipa, dando autonomia para expressar a sua criatividade e tomar decisões;
– Defino metas desafiadoras, incentivando o crescimento e a busca pela excelência;
– Promovo uma cultura de aprendizado, onde erros são vistos como oportunidades de crescimento;
– Seguindo esses princípios, viso inspirar e capacitar a minha equipa a alcançar o seu pleno potencial criativo.
Do ponto de vista do design, quais são, para si, os elementos essenciais quando se está a criar o branding ou uma marca do zero?
Do ponto de vista do design, alguns elementos essenciais ao criar o branding ou uma marca do zero são: Identidade Visual, Consistência, Originalidade, Relevância, Versatilidade e Adaptabilidade.
Ao considerar esses elementos essenciais, é possível criar uma marca forte e impactante desde o início.
Existe algum projecto em particular que se destaca como sendo especialmente gratificante ou desafiador para si?
Um projecto em particular que se destaca na minha carreira foi a animação 3D que fiz em 2006 para a cerveja Cuca, quando a Seleção Angolana de Futebol se classificou para o Mundial de Futebol da Alemanha. Criamos um filme animado de 30 segundos mostrando a lata da cerveja Cuca no estádio driblando uma bola de futebol. Foi extremamente gratificante e impactante ver pela primeira vez uma animação feita por mim sendo transmitida na nossa televisão nacional, a TPA.
O desafio de criar uma animação 3D pela primeira vez que capturasse a essência da marca e, ao mesmo tempo, celebrasse um momento importante para o país foi imenso, mas ver o resultado transmitido para todo o país foi uma experiência verdadeiramente gratificante.
Como vê o futuro do design e da publicidade em geral no contexto angolano?
Vejo um futuro promissor para o design e a publicidade no contexto angolano. Com o avanço da tecnologia e a crescente conectividade, há um vasto potencial para inovação e criatividade na indústria.
Acredito que veremos uma maior integração de estratégias digitais, como marketing de conteúdo, mídia social e publicidade online, para alcançar um público mais amplo e diversificado. Além disso, com o aumento da conscientização sobre a importância do branding e da identidade visual, as empresas angolanas tendem a investir mais em design de qualidade para diferenciar as suas marcas no mercado.
No entanto, também enfrentaremos desafios, como a necessidade de desenvolver talentos locais e promover uma cultura de valorização do design e da criatividade. A educação e o desenvolvimento de habilidades serão fundamentais para impulsionar o crescimento e a profissionalização do sector.
Existem tendências emergentes ou mudanças significativas que acredita que irão moldar o cenário criativo nos próximos anos?
Sim, acredito que várias tendências emergentes irão moldar o cenário criativo nos próximos anos. Isso inclui o avanço da tecnologia, a personalização e a experiência do utilizador, a ênfase no minimalismo e design funcional.
Estas tendências oferecem oportunidades para inovação e exigem que os profissionais do sector permaneçam adaptáveis e actualizados para permanecerem relevantes no mercado criativo.
Lito, como gostaria de terminar a nossa conversa?
Gostaria de encerrar a nossa conversa expressando a minha gratidão pela oportunidade de compartilhar as minhas experiências e perspetivas contigo.
Foi um prazer discutir sobre design, publicidade e criatividade. Se houver mais alguma dúvida ou algo que gostaria de abordar, estou à disposição para ajudar. Obrigado pelo diálogo inspirador!
Conheça abaixo as redes sociais do Lito Ngunza:
Fotografias: 9Filmes