Em muitos países, o empreendedorismo surge como uma escolha livre e entusiasmada: pessoas decidem abrir negócios porque querem transformar uma ideia inovadora em realidade, porque desejam mais autonomia financeira ou porque querem deixar um legado. Mas, em Angola, a realidade é outra. Aqui, o empreendedorismo não é, na maior parte das vezes, uma escolha voluntária, mas uma necessidade.
Para um país onde grande parte da população vive em situação de pobreza e o mercado formal de trabalho não consegue gerar empregos para todos, empreender é, para muitos, a única saída possível. É uma resposta imediata às dificuldades diárias, uma forma de sobreviver quando o emprego não está ao alcance.
O paradoxo angolano: riqueza natural, pobreza social
Angola é um país rico em recursos naturais. O petróleo, os diamantes e outros minerais preciosos fazem do território angolano uma das nações mais ricas do continente africano em termos de potencial económico. No entanto, essa riqueza não se traduz automaticamente em bem-estar para todos.
As desigualdades sociais são visíveis, o acesso a serviços básicos como saúde e educação ainda é desigual e o desemprego, especialmente entre os jovens, atinge níveis alarmantes. Isso cria um contexto em que, em vez de ser uma alternativa, o empreendedorismo torna-se a única solução possível para quem quer ter rendimento.
Empreendedorismo de sobrevivência: o rosto da resiliência
Nas ruas de Luanda, Benguela, Lubango, Huambo e outras cidades, o que se vê é um cenário pulsante de pequenos negócios e iniciativas informais. São as zungueiras que percorrem as ruas de sol a sol, os jovens que montam pequenos salões de corte ou oficinas improvisadas, os vendedores nos mercados, os taxistas clandestinos, os técnicos de telemóveis, os que criam apps ou pequenos serviços digitais com o pouco que têm.
Esse tipo de empreendedorismo nasce da falta de alternativas no mercado formal. É alimentado pela urgência em garantir o básico: comida na mesa, escola para os filhos, medicamentos quando necessário.Reflecte a capacidade do angolano em criar soluções com o que está ao seu alcance, mesmo nas condições mais desafiadoras.
O empreendedorismo em Angola, na sua maioria, não surge por inspiração de grandes histórias de sucesso ou por vontade de se tornar milionário, mas como uma forma de resistência e sobrevivência.
As dificuldades do caminho
Apesar do espírito inovador e resiliente do povo, o pequeno empreendedor em Angola enfrenta muitos desafios:
Falta de acesso a financiamento: os bancos e instituições financeiras raramente oferecem crédito acessível para pequenos negócios, e quando oferecem, os juros são muitas vezes proibitivos.
Baixa escolaridade e falta de formação técnica: Muitos empreendedores não tiveram a oportunidade de estudar gestão, finanças ou marketing, o que limita o crescimento e a sustentabilidade dos negócios.
Infraestrutura precária: a ausência de serviços básicos consistentes, como energia eléctrica, internet estável e estradas em boas condições, limita o alcance e o potencial de expansão dos pequenos negócios.
Peso da informalidade: grande parte dos negócios funciona sem registo oficial, o que deixa o empreendedor desprotegido, sem acesso a benefícios legais ou à possibilidade de participar em grandes cadeias de fornecimento.
Quando a necessidade encontra a oportunidade
Apesar dos obstáculos, Angola começa a testemunhar mudanças. Várias organizações, tanto públicas quanto privadas, reconhecem a importância de apoiar o pequeno empreendedor e estão a desenvolver programas de apoio:
Formação e capacitação: cursos e oficinas voltados para ensinar gestão, contabilidade básica e marketing.
Incubadoras e hubs de inovação: espaços onde pequenos negócios podem nascer e receber orientação especializada.
Microcrédito e linhas de financiamento específicas: programas que oferecem pequenas quantias com juros mais baixos e condições mais flexíveis.
Iniciativas de formalização: apoio para que pequenos negócios deixem de ser informais e passem a integrar o mercado formal, com acesso a contratos maiores e mais estabilidade.
Essas iniciativas são sementes que, bem cuidadas, podem ajudar a transformar o empreendedorismo em Angola de um acto de necessidade para uma escolha estratégica, capaz de gerar emprego, inovação e desenvolvimento sustentável.
O futuro do empreendedorismo angolano
O grande desafio de Angola é criar um ambiente em que o empreendedorismo deixe de ser apenas um reflexo da carência e se torne uma força geradora de riqueza para todos. Isso exige políticas públicas consistentes, investimento em educação e tecnologia, melhorias na infraestrutura e uma maior inclusão financeira.
O povo angolano já demonstrou, vezes sem conta, a sua capacidade de adaptação, coragem e criatividade. Cabe agora às lideranças e à sociedade como um todo transformar a necessidade em oportunidade, e a oportunidade em progresso para todos.
O empreendedorismo em Angola é, hoje, um retrato fiel da realidade do país: uma mistura de dificuldades e esperança, de desafios e superação. É o motor que move milhões de pessoas que, todos os dias, levantam-se para lutar por um futuro melhor, não porque escolheram, mas porque precisam. Que o futuro reserve um cenário em que empreender seja, finalmente, uma escolha de liberdade e realização.

Marcelino Caoio
Gestor de Tráfego Pago e Fundador da Viralize
Gestor de Projectos Digitais na Anda