O conflito é real em todos os sectores das sociedades modernas, isto inclui as empresas em que todos nós trabalhamos. Tendo em conta a intensidade que se coloca nos dias de hoje no tratamento dos temas, o que acaba por propiciar situações conflituosas em que muitos trabalhadores optam por pedir demissão.
“Colocar a carta” — ou seja, pedir demissão — tornou-se um tema mais profundo do que apenas uma decisão profissional. Acaba por ser, muitas vezes, um acto silencioso de exaustão emocional, desilusão com a liderança e falta de reconhecimento. A carta de demissão, portanto, não é o início de um problema, mas o reflexo de algo que já vem se acumulando há algum tempo.
Em Angola essa realidade ganha contornos ainda mais complexos. O ambiente corporativo local, em muitos dos casos é marcado por lideranças desajustadas, estruturas rígidas e inflexíveis e uma cultura onde o “manda quem pode, obedece quem tem juízo” ainda prevalece e tem deixado marcas profundas na saúde mental dos trabalhadores.
Quando tudo deixa de fazer sentido, partir é única solução?
Em muitas organizações angolanas os líderes ainda se veem como “chefes” e não como gestores de pessoas, pessoas estas que são feitas de emoções e sentimentos. A liderança é confundida com autoridade e não com responsabilidade. No entanto, o líder precisa compreender que o seu papel vai além de cobrar resultados: ele deve criar um ambiente saudável, onde o trabalhador se sinta valorizado, ouvido e parte do propósito colectivo.
O líder que ignora o sofrimento da sua equipa contribui directamente para o aumento dos pedidos de demissão. E mais grave ainda: ajuda a perpetuar uma cultura de medo e silêncio.
Cada vez mais profissionais chegam ao limite. O ambiente já não é propício, as relações interpessoais são desgastantes e a motivação desaparece. A insatisfação cresce quando o trabalhador percebe que o seu esforço não é reconhecido, o retorno financeiro não acompanha o seu empenho e, enquanto a empresa prospera, ele permanece estagnado.
É perigoso quando o status da empresa em que trabalhas não reflecte no seu quotidiano. Essa discrepância cria um abismo emocional. Trabalhar deixa de ser um espaço de realização e passa a ser um fardo. E quando o peso se torna insuportável, a carta de demissão surge — não como um gesto de fuga, mas como um grito por equilíbrio e dignidade.
Nesta fase, deixa de fazer sentido a abertura de um espaço para o diálogo, pois não mudará nada, a decisão já foi tomada. Partir, passa a ser a única solução.
Os aspectos citados acima são cruciais para a tomada de decisão, no entanto existem outros que podem pesar na decisão.
Fora do ambiente corporativo, o trabalhador enfrenta uma série de desafios sociais: o custo de vida, as pressões familiares, a instabilidade económica e a busca por uma vida digna. Muitos carregam o fardo de sustentar famílias inteiras, o que intensifica a ansiedade e a sensação de fracasso quando o trabalho não oferece retorno proporcional.
A saúde mental, por sua vez, é um tema ainda negligenciado nas organizações angolanas. O “aguenta firme” e o “isso é normal” continuam a ser frases comuns. Contudo, por detrás desses discursos, há pessoas que adoecem em silêncio, que se sentem vazias e que, no limite, acabam por decidir partir, não porque querem, mas porque precisam preservar a própria sanidade.
Conselhos para as Chefias e Empresas
Um trabalhador mentalmente doente nem sempre grita por ajuda, em muitos casos opta pelo silêncio. Mudanças de comportamento, isolamento, queda no desempenho, irritabilidade e falta de entusiasmo são sinais que pedem atenção imediata. O olhar atento da liderança pode ser o primeiro passo para salvar uma carreira e, por vezes, uma vida.
Liderar é cuidar. É perceber que resultados vêm de pessoas equilibradas, respeitadas e motivadas. As chefias devem promover empatia, abrir espaço para o diálogo e reconhecer que um “como estás?” verdadeiro pode ser muito valioso. Lutem pelos seus liderados.
As empresas precisam criar espaços de escuta e confiança. Pequenos gestos como uma conversa sincera, um acompanhamento próximo ou uma pausa para respirar, podem evitar grandes tragédias. É fundamental agir com humanidade antes que a exaustão seja real.
Conselhos para os trabalhadores
Como conselhos, vou usar algumas frases que sigo e acho que fazem muito sentido:
“Não permaneça onde não te sintas respeitado”;
“Quem não se posiciona, é posicionado”;
“Nenhum salário paga a tua saúde mental”;
“Valoriza-te o suficiente para entender que partir, às vezes, é o maior acto de amor-próprio”.
Em suma, “Colocar a carta de demissão”, portanto, é consequência, não causa. É o resultado de uma série de falhas acumuladas (de ambas partes): falta de empatia, ausência de reconhecimento, más condições de trabalho e lideranças que ainda não compreenderam o verdadeiro valor humano dentro das empresas.
Se quisermos evitar a saída dos melhores talentos, precisamos olhar mais fundo. É tempo de humanizar as relações de trabalho nas nossas empresas. De transformar a cultura organizacional, capacitar líderes para cuidar das suas equipas e criar espaços onde o diálogo e o bem-estar sejam prioridade.
Porque, no fim, “está mais do que provado que, os trabalhadores não desistem das empresas, os, trabalhadores desistem das suas chefias directas e dos seus colegas mais próximos”.

Luís Joaquim
Especialista em Gestão e
Desenvolvimento Humano