O cenário global da publicidade digital tem atravessado uma transformação profunda nos últimos anos. Segundo o DataReportal, em 2024, 82,4% dos investimentos publicitários digitais foram programáticos ou seja, realizados de forma automatizada, com decisões de compra em tempo real e optimizadas por inteligência artificial. Esse modelo tornou-se o eixo central do ecossistema publicitário mundial, a ponto de já ser considerado ubíquo. Hoje, a mídia programática não se limita apenas a banners em websites, mas é parte integrante de formatos como Connected TV (CTV), áudio digital, vídeos online e até meios exteriores digitais (DOOH – Digital Out-of-Home). As projecções apontam para que, até o final de 2025, 80% de todo o investimento digital global esteja assente neste formato.
Este avanço não ocorreu de forma repentina. Nos principais mercados, a publicidade digital percorreu uma curva de maturidade que envolveu três etapas decisivas: primeiro, a entrada das grandes plataformas tecnológicas como Google e Meta; depois, a integração de dados para melhorar a segmentação e mensuração de resultados; e, por fim, a adopção de processos automatizados e inteligentes que hoje caracterizam a mídia programática.
No entanto, Angola encontra-se numa fase distinta dessa evolução. O país já deu passos relevantes na digitalização do sector, com a crescente adopção de ferramentas como Google Ads, Meta Ads e outras plataformas globais, sobretudo para campanhas de performance e branding. Marcas nacionais e internacionais presentes no mercado angolano utilizam cada vez mais a publicidade digital para chegar ao consumidor, acompanhando o ritmo de transformação dos hábitos de consumo de mídia.
Ainda assim, existe uma diferença substancial em relação ao estágio global. A compra de mídia em Angola continua, em grande medida, a ser manual, baseada em negociações directas com veículos e plataformas, e com menor integração de dados comportamentais, geográficos e contextuais. A inteligência artificial e os algoritmos preditivos, que em mercados maduros já definem em milissegundos onde e quando um anúncio deve aparecer, ainda não são parte estruturante da realidade local.
Esse fosso tecnológico revela uma disparidade clara: enquanto os mercados internacionais operam num ambiente altamente sofisticado, automatizado e orientado por dados, o ecossistema angolano ainda constrói os seus alicerces. O resultado é um ritmo de crescimento digital positivo, mas que não acompanha a velocidade do resto do mundo.
Por um lado, esta situação pode ser interpretada como um atraso. Por outro, é também um reflexo do estágio natural de desenvolvimento do mercado, considerando factores como infraestrutura digital, custos tecnológicos e maturidade dos anunciantes. O que é inegável é que a publicidade digital em Angola já entrou numa fase irreversível de expansão: o consumidor angolano está cada vez mais conectado, as marcas já reconhecem o valor das plataformas digitais, e os investimentos têm crescido de forma consistente.
O desafio, agora, é compreender que a indústria global avança para uma lógica cada vez mais programática e automatizada, enquanto o mercado angolano ainda depende fortemente de modelos tradicionais. Esse desfasamento levanta uma questão estratégica: quando e como o ecossistema publicitário angolano se alinhará à nova fronteira global da publicidade digital?

Marcelino Caoio
Gestor de Tráfego Pago e Fundador da Viralize
Gestor de Projectos Digitais na Anda





