A Lei n.º 7/15, de 15 de Junho, conhecida como a Lei Geral do Trabalho (LGT) foi aprovada em 2015 revogando a Lei n.º 2/00, de 11 de Fevereiro, com o objectivo de alavancar o crescimento e o desenvolvimento económico e social do país, a empregabilidade e sua estabilidade, a dinamização da actividade económica e consolidação da justiça social.
Volvidos mais de 7 anos surge agora no nosso panorama, uma discussão sobre reformas que se devem efectuar na Lei acima referida, fruto da globalização, do surgimento de novas tendências, mudanças de realidades e também de desafios que passamos a enfrentar no nosso dia-a-dia.
Esta discussão aparece justificada no Relatório de Fundamentação da Proposta de Revisão da Lei Geral do Trabalho como sendo uma revitalização do Direito do Trabalho angolano, marcada fundamentalmente por mudanças no paradigma da formação, vigência e cessação das relações laborais.
O objectivo da Proposta de Revisão da Lei Geral do Trabalho visa o alcance do artigo 1.º da Constituição da República de Angola (CRA) por mediação do qual se perspectiva a realização concreta do Direito e a constante redefinição teleológica dos valores da Dignidade Humana, Justiça, Equidade, Liberdade e Solidariedade que se configuram como premissas do processo de construção do Estado de Direito Material. Para que não haja manifestação de incompatibilidade com os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, expressamente consagrados na Constituição da República de Angola.
Das alterações previstas, vamos nos focar num tema que tem gerado bastante interesse e discussão: o Contrato de Trabalho, em que a Proposta de Revisão da Lei Geral do Trabalho nos remete ao seguinte artigo:
Artigo 14.º
(Duração do contrato de trabalho)
1. O contrato de trabalho é celebrado em regra por tempo indeterminado integrando o trabalhador no quadro do pessoal permanente da empresa.
2. O contrato de trabalho pode ser celebrado por tempo determinado para execução duma obra ou serviço determinado e é obrigatoriamente reduzido a escrito, incluindo, para além das menções a que se refere a nº 3 do artigo 13º, a indicação precisa do seu termo ou das condições a que este fica sujeito, bem como das razoes determinantes da contratação por tempo determinado.
3. Na falta de forma escrita ou das menções exigidas no número anterior, o contrato considera-se por tempo indeterminado, salvo nas situações que se refere o nº 3 do artigo seguinte.
4. Salvo disposição expressa em contrário, aos trabalhadores contratados por tempo determinado aplicam-se todas as disposições legais ou convencionais relativas à prestação de trabalho por tempo indeterminado.
5. São proibidos os contratos celebrados por toda a vida do trabalhador.
No documento que neste momento já foi discutido e aprovado na casa das leis, o legislador estabelece no seu artigo 14º, nº1, o Contrato por Tempo Indeterminado como regra.
O contrato de trabalho por prazo indeterminado é definido como a contratação efectiva do colaborador sem estipular um prazo final para esse acordo. Nesta ordem de ideias, cai por terra a intenção da não renovação contratual que aparece contemplada na actual lei para os contratos-regra.
Isto leva-nos a entender que todo e qualquer funcionário que venha a ser contratado após a aprovação, divulgação e publicação da nova LGT, deverá fazê-lo por meio de um contrato indeterminado. Para uma linguagem mais terra à terra, este será considerado um funcionário efectivo desde o seu primeiro dia de trabalho.
No entanto, o mesmo legislador abre portas (e que portas!) para que sejam celebrados Contratos por Tempo Determinado (como uma excepção), dependendo da especificidade da empresa, ramo de actuação, actividade e demais condições conforme o artigo 15º, nº2, nos seguintes termos que passamos a citar:
Artigo 15.º
(Causas do Contrato de trabalho por tempo determinado)
1. O contrato de trabalho por tempo determinado só pode ser celebrado nas seguintes situações:
a) Substituição de trabalhador temporariamente ausente;
b) Acréscimo temporário ou excepcional da actividade normal da empresa resultante de acréscimo de tarefas, excesso de encomendas, razão de mercado ou razoes sazonais;
c) Realização de tarefas ocasionais e pontuais que não entram no quadro de actividade corrente da empresa;
d) Trabalho sazonal;
e) Quando a actividade a desenvolver, por ser temporariamente limitada, não aconselha o alargamento do quadro do pessoal permanente da empresa;
f) Execução de trabalhos urgentes necessários ou para organizar medidas de salvaguarda das instalações ou dos equipamentos e outros bens da empresa de forma a impedir riscos para esta e para os seus trabalhadores;
g) Lançamento de actividades novas de duração incerta, início de elaboração, reestruturação ou ampliação das actividades duma entidade empregadora ou centro de trabalho;
h) Emprego de diminuídos físicos, idosos, candidatos a primeiro emprego e desempregado há mais de um ano ou elementos doutros grupos sociais abrangidos por medidas legais de inserção ou reinserção na vida activa;
i) Execução de tarefas bem determinadas, periódicas na actividade da entidade empregadora, mas de carácter descontínuo;
j) Execução, direcção e fiscalização de trabalhos de construção civil e obras públicas, montagem e reparações industriais e outros trabalhos de idêntica natureza e temporalidade;
k) Aprendizagem e formação profissional prática;
2. O contrato de trabalho por tempo determinado pode ser celebrado a termo certo, isto é, com fixação precisa da data de sua conclusão ou do período por que é celebrado ou no caso das alíneas a), c), d), e), f), i) e j) do número anterior, a termo incerto, isto é, ficando o seu termo condicionado à desnecessidade da prestação do trabalho por cessação dos motivos que justificaram a contratação por tempo determinado.
3. Não obstante o disposto no nº 3 do artigo anterior, é dispensado a redução do contrato a escrito nas situações a que se referem as alíneas c), d) e) e f) do nº 1.
4. É nula a estipulação do termo feita em fraude a lei.
Tendo em conta o artigo 15º, existem várias possibilidades para se adoptar a contratação de funcionários por tempo determinado, devendo apenas para o efeito invocar qualquer ou o acumulado dos pontos que constam no mesmo artigo.
Conhecendo o mercado e o empresariado local, estas condições constituem as mais acessíveis de serem justificadas para o que devia ser considerada uma excepção. Obviamente, aqui o legislador abre uma brecha que considero grande para fugir ao contrato de trabalho por tempo indeterminado que se quer vincar como contrato-regra.
No entanto, para podermos perceber estas brechas, devemos ter em conta o artigo seguinte:
Artigo 16.º
(Duração do contrato por tempo determinado)
1. O contrato de trabalho por tempo determinado não pode exceder:
a) 6 meses, nas situações a que se referem as alíneas d) e f) do nº. 1 do artigo anterior;
b) 12 meses, nas situações referidas nas alíneas b), c) e e) do artigo anterior;
c) 36 meses, nas situações referidas nas alíneas a), h), j) e k) do artigo anterior;
d) 60 meses, nas situações referidas nas alíneas g) do artigo anterior.
2. Nas situações a que se referem as alíneas a), h) e j) do n.º 1 do artigo anterior, pode a Inspecção Geral do Trabalho autorizar o prolongamento da duração do contrato para além de 36 meses, mediante requerimento fundamentado da entidade empregadora, acompanhado de declaração de concordância do trabalhador, designadamente se:
a) O regresso do trabalhador temporariamente ausente na empresa tiver lugar dentro daquele prazo;
b) A duração dos trabalhos de construção civil e actividades equiparadas for ou se tornar superior a três anos;
c) As medidas legais de política de emprego dos grupos sociais a que se refere a alínea h) do artigo anterior estiverem ainda em aplicação a data de termo dos 36 meses do contrato.
3. O requerimento a que se refere o número anterior deve ser apresentado até 30 dias antes do termo do contrato.
4. O prolongamento da duração do contrato, a que se refere o nº 2, não pode ser autorizado por mais de 24 meses.
Como podem ver, quanto a sua duração, o legislador não apresenta grandes novidades e/ou empecilhos, tornando mais uma vez o que se definiu como a excepção pode claramente tornar-se a regra do jogo.
Artigo 17.º
(Renovação do contacto a termo certo)
1. Sendo o contrato a termo certo celebrado por período inferior aos limites estabelecidos no nº 1 do artigo anterior, podem ser realizadas renovações sucessivas até os limites acima referidos.
2. A renovação do contrato por período de duração igual ao inicialmente estabelecido verifica-se sempre que, até duas semanas antes do seu termo, o empregador não informe por escrito o trabalhador da caducidade e este não pretenda prevalecer-se dela.
3. A renovação do contrato por período diferente do inicial, só pode ser feita por escrito, assinado pelas duas partes.
O Contrato por tempo determinado pode ser renovado sucessivamente e convertido em Contrato por Tempo Indeterminado se forem ultrapassados os limites máximos estabelecidos na Lei, limites estes que vão até 60 meses, ou seja, 5 anos. Pois é, não parece haver novidade alguma, uma vez que este limite já existe na Lei actual (Lei n.º 7/15, de 15 de Junho).
Esta medida de definição do Contrato por Tempo Indeterminado como regra dá a sensação de segurança e poder para os funcionários. Porém trata-se apenas disso: uma sensação. Na prática, pouco ou nada se alterará nas relações jurídico-laborais.
Lamento desapontá-los, mas defendo que a segurança contratual é cimentada pela competência, pelo profissionalismo, disciplina, humildade, eficiência e pela eficácia (dentre outros atributos profissionais) sem que esteja relacionada com um contrato, seja ele por tempo determinado e indeterminado.
De referir também que existe uma contradição naquilo que o legislador pretendia e aquilo que na realidade vai acontecer. Se a ideia passava por definir o contrato por tempo indeterminado como regra, então não vemos necessidades de existirem tantas saídas para se fugir dela.
Entendemos que estas medidas irão na maioria beneficiar as médias e grandes empresas, com capacidades económicas, jurídicas, estruturais e sociais muito fortes e capazes de fazer frente aos desafios do mercado, aos conflitos laborais, engolindo cada vez mais as micro e pequenas empresas.
As grandes empresas em Angola irão invocar maioritariamente as ou uma combinação (por exemplo das alíneas b), c), d) e f)) para justificar toda e qualquer contratação por tempo determinado.
Acertada ou não, só o tempo dirá e nós estaremos aqui para opinar.
Muito bem analisado. Inicialmente, as propostas parecem atrativas e, finalmente, vantajosas para a classe trabalhadora, porém, as brechas nos remetem ao mais do mesmo, infelizmente.
Infelizmente meu kota Hidro. Quando pensamos que as leis seriam para melhor, elas apresentam lacunas que indiciam o contrário.
Artigo muito bom e útil. Forçaaaa Luís.
Muito bem feita análise.
Anilton meu parceiro! Grato!
Muito Obrigado amigo Alberto.
Muito bom adorei 🙏
Grato!