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A energia é nossa. O futuro por enquanto não é!

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Por Targeting
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Há dias, durante uma sentada com dois primos meus, falávamos sobre transformação digital e acabámos todos a discutir o que Angola poderia realmente fazer para não ficar só a assistir ao jogo. A conversa começou porque li que o Brasil quer investir forte na inteligência artificial, com um plano federal de vários milhares de milhões até 2028. Não é sobre o Brasil em si. É sobre o que esta ambição nos diz a nós.

A certa altura, deixei de olhar para a notícia e comecei a pensar na ponte possível. É fácil ficar impressionado com planos grandiosos, mas o que define um país não é o anúncio. É a execução. E é aqui que a reflexão nos toca directamente. Angola fala de transformação digital há anos, tem documentos estratégicos, tem acordos com parceiros internacionais, tem visões no papel. Mas o que é que realmente avança? Quem é o responsável directo pelo progresso? Onde está a monitorização?

E como se garante que as intenções se transformam em mudanças reais na vida das pessoas?
Transformação digital não é comprar software. É mudar a forma como o Estado e as empresas pensam, decidem, executam e preparam pessoas. E foi neste ponto da conversa com os meus primos que percebemos uma coisa que quase nunca entra nestas discussões. Angola tem uma vantagem que muitos países dariam tudo para a ter. Energia acessível e abundante. Foi aí que o assunto virou para data centers. E, honestamente, nada fez mais sentido.

A revolução da inteligência artificial não acontece nos ecrãs. Acontece em espaços gigantescos, repletos de servidores, alimentados por energia estável e conectados à velocidade que o mundo exige. Esses centros de dados são hoje a infraestrutura invisível que dá vida ao que chamamos IA. E poucos países africanos têm condições tão favoráveis como Angola para se tornarem competitivos neste domínio.

Se quisermos ser parte desta transformação, temos de começar aqui. Transformar energia em capacidade computacional. Energia não é só um custo. É uma vantagem estratégica. E, se Angola quiser disputar espaço no futuro digital global, precisa de decisões sérias que criem as bases certas.

Um regime próprio para centros de dados com contratos de energia estáveis e previsíveis; infra-estrutura de fibra óptica com qualidade garantida e acesso competitivo a cabos internacionais; incentivos fiscais inteligentes para equipamentos críticos; licenciamentos rápidos e transparentes para projectos tecnológicos e um quadro sólido de protecção de dados que inspire confiança a quem investe, a quem opera e a quem depende da informação.

Com isto, não precisamos esperar pelo interesse de gigantes como Amazon ou Google. Podemos começar por algo mais estratégico. Criar um cluster de computação de alta performance para servir banca, saúde, petrolíferas, universidades, telecomunicações e, a médio prazo, toda a região austral. A vantagem está na energia. O valor está na capacidade de processamento. E o futuro pertence a quem controla ambos.

Assim como se faz nas criptomoedas precisamos de minerar conhecimento. O mesmo tipo de infra-estrutura pode ser direccionado para IA, simulações, modelos climáticos, análise geoespacial, biotecnologia e finanças. A energia serve o que o país decidir servir. E aqui está o verdadeiro poder.
O que me inquieta é que não vejo ainda um movimento coordenado. A política energética e a política digital avançam em paralelo, raramente em diálogo. O sector privado olha para tecnologia como custo, não como soberania económica. E a cada ano que passa esta janela de oportunidade fecha-se um pouco mais.

Se Angola quiser mesmo entrar na corrida, precisa de uma estrutura que responda por isto. Um gabinete digital nacional com autoridade real, metas trimestrais e capacidade de cobrar resultados a ministérios, empresas públicas e parcerias estratégicas. Sem isto, continuaremos a produzir planos que não ultrapassam a fase de anúncio.

O ContraPonto é este, o Brasil fala em ser movido a IA. Angola ainda fala em ser digital. A diferença é grande.

A pergunta que vale a pena fazer não é quando seremos uma nação movida a IA.
É se estamos preparados para usar a nossa maior vantagem competitiva, a energia, para construir a infra-estrutura que define quem participa e quem assiste no futuro da economia digital.

David Moisés

Estratega de Marcas e Negócios

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