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Pagamento de Retroactivo: um caso de estudo que depende da boa vontade do empregador

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Por Targeting
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Pouco se tem falado sobre o assunto, para alguns é desconhecido, para outros nem tanto. A verdade é que trata-se de um tema quase sempre presente nas relações jurídico-laborais, mais concretamente na matéria sensível que é a remuneração.

 

Retroactivo, tal como o nome sugere, refere-se a assuntos passados e em matéria de remuneração. Usa-se quando nos referimos a um montante que corresponde a vencimentos devidos, cujo pagamento está em atraso. A este montante damos o nome de Pagamento de Retroactivos. É e deve ser efectuado com base nos proporcionais das rubricas em atraso correspondentes ao período de trabalho do funcionário, quer sejam de salário base e/ou outros subsídios de direito, respeitando sempre a configuração de impostos que a Lei prevê para cada uma das rubricas de processamento a pagar.

 

Para que exista um Pagamento de Retroactivo, logicamente deve haver uma relação jurídico-laboral entre funcionário e empregador, relação que é consolidada aquando da assinatura de um contrato de trabalho.

 

Normalmente as empresas privadas dão início ao processamento salarial entre os dias 15 a 20 de cada mês, período este em que são recolhidas todas as informações inerentes ao processo (validação de admissões, saídas, alterações funcionais e salariais, promoções, transferências, faltas, horas extras, licenças, prémios, subsídios e etc). No entanto, devido as dinâmicas e as exigências das operações, uma vez que o fluxo de recrutamento dificilmente pára, podem e surgem, logicamente, admissões a partir do dia 20 até ao final de cada mês, acabando estes por ficar de fora do processamento salarial do mês em curso, fazendo com que não constem, infelizmente, na folha de salários do mês em referência.

 

Já no mês seguinte, há necessidade de se efectuar a regularização com os funcionários na condição acima referida, sendo que devem ser pagos todos os pendentes do exercício do mês anterior. Esta regularização deve ser feita em forma de Pagamento de Retroactivo, devendo estar devidamente discriminado tanto no recibo do funcionário, como nos registos contabilísticos.

 

Os Pagamentos de Retroactivos, dependendo da rubrica a utilizar, podem ser classificados da seguinte forma:

 

1. Retroactivos sujeitos à IRT e INSS – (Salário base a partir de 70.000,00 AKZ, subsídios de alimentação e/ou transporte a partir de 30.000,00 AKZ, demais prémios e/ou subsídios sujeitos);

 

2. Retroactivos sujeitos à IRT – (Subsídios de férias, férias não gozadas e proporcionais de férias);

 

3. Retroactivos sujeitos à INSS – (Salário base até 70.000,00 AKZ, subsídios de alimentação e/ou transporte até de 30.000,00 AKZ, demais prémios e/ou subsídios sujeitos).

 

P.S: consultar o Decreto Presidencial n.º 227/18 de 27 de Setembro – Capitulo III, Artigo 13º.

 

Estudo de caso

 

PS: todos os valores referidos no caso abaixo são em moeda nacional e lhes são aplicados as tabelas de IRT e Segurança Social vigentes em Angola (AOA ou AKZ).

 

O Sr. José Manuel Capitão foi contratado e admitido a 20 de Abril de 2023, e foi-lhe estipulado no contrato de trabalho um salário base mensal de 400.000,00, sendo que, pela sua data de entrada, o funcionário não recebeu o seu salário em Abril de 2023. Assim sendo, o seu primeiro salário será apenas processado em Maio de 2023, pelo que, para este referido mês, atendendo a situação, o seu processamento passa a ser:

 

Salário base de Maio: 400.000,00;

 

Retroactivo sujeito à IRT e INSS (trabalho prestado em Abril): 266.666,67;

 

Segurança Social: 20.000,00;

 

IRT: 116.583,00;

 

Total líquido a receber: 530.083,67.

 

No entanto, caso o Sr. José Manuel Capitão tivesse o seu salário processado em Abril de 2023, teríamos os seguintes resultados:

 

Proporcional de dias trabalhados: 266.666,67;

 

Segurança Social: 8.000,00;

 

IRT: 41.810,00;

 

Total líquido a receber: 216.856,67.

 

Sendo que o seu salário correspondente ao mês de Maio de 2023 seria processado da seguinte forma:

 

Salário base: 400.000,00;

 

Segurança Social: 12.000,00;

 

IRT: 65.970,00;

 

Total líquido a receber: 322.030,00.

 

Ora vejamos, se os salários do funcionário fossem processados de forma separada, teríamos um acumulado líquido total de 538.886,67. No entanto, face a impossibilidade de se processar ambos salários de forma separada, uma vez que o exercício contabilístico não permite, a empresa é obrigada a accionar o Pagamento do Retroactivo, sendo que o funcionário acaba por receber em Maio um valor acumulado líquido total de 530.083,67.

 

A pergunta que nos colocamos nas vestes de funcionários é: onde é que vão os 8.803,00?

 

Na verdade, esta diferença encontra-se incrementada no Imposto sobre o Rendimento de Trabalho, porque uma vez que se acumulam os dois rendimentos (neste caso o Retroactivo de Abril com o salário base de Maio) gera uma subida na matéria colectável que inicialmente encontrava-se no 6º Escalão de 19% e passa automaticamente para o 7º Escalão de 20%, o que concorre para um maior pagamento de impostos. E quem paga este IRT?, o funcionário claramente!

 

De realçar que só existirão diferenças quando nos deparamos com Retroactivos sujeitos à IRT e Retroactivos sujeitos à INSS/IRT, sendo que para os Retroactivos sujeitos à INSS não se registam, na maior parte dos casos, alterações na matriz de impostos. Neste caso, a diferença de IRT sai de 107.780,00 para 116.583,00, fazendo com que constitua um “ganho” para o Estado.

 

Face ao caso de estudo, propõe-se as seguintes soluções:

 

1. Padronizar as admissões – é uma medida que pode ajudar a baixar a necessidade de Pagamentos de Retroactivos. Se se definir um fluxo de entradas nos intervalos de 1 a 10 ou a 15 de cada mês;

 

2. Acerto por parte da empresa – constitui numa medida solidária por parte da empresa em decidir assumir os valores e cobrir a diferença.

 

A primeira solução é difícil de se cumprir na íntegra porque as empresas não vivem só de procedimentos, existem decisões que quando tomadas podem prejudicar o andamento das operações e consequentemente o cumprimento de prazos, metas, planos e objectivos previamente definidos pela empresa.

 

A segunda solução é demasiada arriscada em termos organizacionais, pois pode ser considerada ultrapassável se for um número reduzido de trabalhadores, mas tende a se tornar insuportável quando nos deparamos com casos de vários funcionários nesta condição. Sem dizer que a compensação de rendimentos causa uma agravação nos impostos que a empresa tende a pagar ao estado, nomeadamente nos 8% da entidade empregadora no Instituto Nacional de Segurança Social e na submissão anual de Pagamento de Imposto sobre o Rendimento de Trabalho (Modelo 2), podendo causar um aumento assustador.

 

Qualquer uma das soluções acima seriam como sacrificar um braço em detrimento da perna, ou seja, ou prejudica um, ou prejudica outro. E na nossa realidade actual, os mais fortes nas relações jurídico-laborais vencem. Sendo que, nesta relação, existe um interveniente que sempre sairá a ganhar: o Estado Angolano, na pessoa da Administração Geral Tributária com o seu Imposto sobre o Rendimento de Trabalho.

Luís Joaquim
Especialista em Gestão e Desenvolvimento Humano
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16 Comentários
  • Ficou claro que os funcionários saem a perder caso não exista um padrão nos períodos de contratação. Mas também deu para perceber que as empresas não estão dispostos a repartir esse custo (impostos).

    Um artigo altamente esclarecedor.

    Portanto, resta-me a seguinte questão: apesar de já deixares as suas sugestões para os empregadores. Quais são as suas sugestões de melhoria do Decreto regulamenta todo este processo?

    • Caro amigo Alfredo Chihine.
      Grato pela sua pergunta e respectivo feedback.
      Respondendo a sua questão, já deve ter notado que o denominador comum do problema tanto do Funcionário como o Empregador chama-se IRT, por este ter uma tabela progressiva que faz com que rendimentos por cima de rendimentos tenham uma taxa sempre a subir (como a música do Sebem faz referência).
      Uma Melhoria no Decreto que regulamenta este processo seria propriamente reformar a própria tabela de IRT (Escalões, percentagens, e etc). Muito sinceramente, não acho que o nosso Estado esteja a pensar por aí, uma vez que, de uns anos pra cá, os impostos passaram a ser fonte tão ou mais importante de receita Estatal que o Petróleo.

      Como dizem os Espanhóis: “Es lo que hay”

      Juntos!

  • Luís meu parabéns pelo artigo. Estava preste a responder sobre o ponto 1 das soluções. Mas notei que abaixo respondeste de forma clara.

  • Bom artigo.
    Uma curiosidade. Um funcionário nomeado em 2018, e não recebeu o vencimento da nomeação até 2022, é exonerado ou sofre uma mudança em 2023, lhe pode ser pago o retroativo em 2023 pela nova gestão?

    • Boa tarde Masivi

      Considera-se retroactivo toda a remuneração que não se chegou a pagar no período (mensal) anterior, ou seja é valor referente à qualquer salário ou subsídio que não tenha sido pago anteriormente. O seu valor total depende da quantidade de dias que não foi pago.

      ESpero ter esclarecido a questão.

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